O impacto de “Sodade” de Cesária Évora na música global e na divulgação da morna além das fronteiras de Cabo Verde.
Cesária Évora, conhecida como a “diva dos pés descalços”, nasceu em 27 de agosto de 1941 na cidade do Mindelo, na ilha de São Vicente, Cabo Verde. Desde jovem, mostrou talento para o canto, influenciada pela rica tradição musical das ilhas e pelos estilos que escutava no rádio, como morna, coladeira e fado. Iniciou sua carreira em bares e rádios locais nos anos 1950, mas enfrentou dificuldades financeiras e pessoais que a afastaram temporariamente da música. Durante quase duas décadas, viveu no anonimato, sustentando-se com trabalhos informais, até ser redescoberta por produtores musicais franceses nos anos 1980, que a levaram a gravar e se apresentar na Europa.
Seu álbum de estreia internacional, La Diva aux pieds nus (1988), marcou o início de uma trajetória de sucesso global. A consagração veio com Miss Perfumado (1992), que incluía a icônica canção “Sodade” e a projetou mundialmente. Cesária levou a morna ao grande público, sendo a primeira artista cabo-verdiana a conquistar reconhecimento internacional em larga escala. Ao longo de sua carreira, recebeu prêmios importantes, incluindo um Grammy em 2004. Apesar dos palcos luxuosos, manteve o hábito de cantar descalça, em solidariedade aos pobres de sua terra natal. Faleceu em 17 de dezembro de 2011, mas deixou um legado duradouro como embaixadora da alma musical de Cabo Verde.
Sodade: A Melodia da Saudade Cabo-Verdiana
“Sodade” é uma das canções mais emblemáticas da música cabo-verdiana e se tornou mundialmente conhecida na voz de Cesária Évora. A palavra “sodade” (variante crioula de “saudade”) expressa o sentimento profundo de nostalgia e dor da separação, um tema central na identidade cultural de Cabo Verde, um país marcado historicamente pela migração. Escrita por Armando Zeferino Soares nos anos 1950, a música tornou-se símbolo da experiência da diáspora cabo-verdiana, especialmente daqueles que foram enviados para trabalhar como contratados em São Tomé e Príncipe durante o período colonial português.
A versão mais famosa, gravada por Cesária Évora em 1992 no álbum Miss Perfumado, foi responsável por levar essa morna ao reconhecimento internacional. Com arranjo minimalista, voz melancólica e interpretação contida, Cesária transmite a dor e a dignidade do povo cabo-verdiano. A música conquistou públicos em diversos países, especialmente na Europa, e passou a representar não só a artista, mas toda a alma musical do arquipélago. “Sodade” é frequentemente interpretada como um lamento coletivo, um hino silencioso dos que partiram e dos que ficaram. Sua melodia e mensagem são imediatamente reconhecíveis e continuam a emocionar ouvintes ao redor do mundo.
A Construção da Identidade Cabo-Verdiana
Cabo Verde possui uma das culturas musicais mais ricas e singulares da África e do mundo lusófono, resultado de séculos de intercâmbio entre influências africanas, europeias e latino-americanas. Composta por dez ilhas com identidades próprias, a nação criou gêneros musicais únicos como a morna, a coladeira, o funaná e o batuque, cada um expressando diferentes aspectos da vida, da resistência e da alegria do povo cabo-verdiano. A música é uma linguagem cotidiana no arquipélago, presente nas festas, rituais e narrativas populares, funcionando como meio de memória, identidade e conexão entre os que vivem nas ilhas e os que partiram para a diáspora. Essa diversidade sonora e poética faz de Cabo Verde um verdadeiro celeiro de expressões culturais autênticas e profundamente emocionais.
