Mestres do Ijexá

Origem da palavra Ijexá

A palavra Ijexá tem uma origem fascinante. Ela vem do vocábulo Ijèsá, que é uma subdivisão da etnia iorubá e também o nome de uma cidade na Nigéria, considerada o berço desse grupo. É nessa cidade que os orixás Oxum e Logunedé são cultuados com grande devoção. O ritmo Ijexá é a expressão musical das danças principais desses orixás. Além disso, também são tocados ijexás para Exu, Osain, Ogum, Oyá, Obá, Oxalá, Orunmilá e outros.

O Ijexá é tocado apenas com as mãos nos terreiros, sem o uso das baquetas de percussão chamadas aguidavis. Esse ritmo é suave e cadenciado, criando um cenário perfeito para a dança graciosa e sensual de Oxum e Logum. O gã (agogô) acompanha os atabaques, marcando o compasso.

Apesar de ser um ritmo tradicional dos terreiros, o Ijexá também ganhou espaço no carnaval, graças à criação dos afoxés baianos. Esses cortejos carnavalescos, formados por adeptos do candomblé, surgiram no final do século XIX. É importante destacar que alguns livros confundem afoxé com ritmo, mas na verdade, o afoxé é o cortejo e o ritmo que embala esse cortejo é o Ijexá. A expressão afoxé, aliás, vem do iorubá àfose, que significa encantação pelo som e pela palavra.

Os cubanos utilizam a expressão afoché para se referir ao ato de enfeitiçar alguém com o pó da magia. No toque do Ijexá, os antigos afoxés buscavam encantar os espectadores, desfilando pelas ruas em formato de procissão. E aqueles que já tiveram a oportunidade de presenciar um xirê certamente se lembram das danças de Oxum e seu filho Logunedé, representando o banho vaidoso nos rios, em um misto de encantamento e ilusão. O toque do Ijexá busca retratar essa cadência sedutora e misteriosa, que envolve os afetos de forma perigosa, assim como as águas aparentemente calmas.

A tradição oral no Ijexá

Durante muito tempo, no Ocidente, as fontes orais foram vistas com desconfiança e até mesmo marginalizadas quando se tratava de reconstruir o passado. No entanto, desde o término da Segunda Guerra Mundial, uma mudança significativa vem ocorrendo, reconhecendo a história oral como uma fonte tão válida quanto as fontes documentais. Atualmente, a oralidade é amplamente discutida nas universidades, inclusive em congressos, encontros regionais, nacionais e internacionais dedicados ao tema.

O Ijexá na música Popular Brasileira

O Ijexá é um ritmo musical e uma dança originários da cultura afro-brasileira, especialmente associados às tradições religiosas afro-brasileiras, como o Candomblé. No Candomblé, o Ijexá é utilizado em celebrações específicas, como festas dedicadas a divindades chamadas de “Orixás”. A música e a dança desempenham um papel importante nessas celebrações, sendo o Ijexá um dos ritmos tradicionais. Além disso, o Ijexá também influenciou a música popular brasileira, sendo incorporado em diversos gêneros musicais, como o samba. Portanto, o termo Ijexá pode ser utilizado de maneiras diferentes, dependendo do contexto cultural e musical em que é empregado.

Vários músicos brasileiros são conhecidos por incorporar elementos do Ijexá em suas composições, especialmente aqueles que têm uma forte ligação com as tradições afro-brasileiras. Aqui estão alguns exemplos:

  • Gilberto Gil: Gil é um cantor, compositor e multi-instrumentista brasileiro que tem uma ampla influência da música afro-brasileira em seu trabalho. Ele explorou ritmos como o Ijexá em várias de suas composições.
  • Caetano Veloso: outro ícone da música brasileira, também incorporou elementos do Ijexá em algumas de suas músicas. Sua abordagem inovadora e experimental da música brasileira o levou a explorar diversas influências.
  • Clara Nunes: foi uma das grandes intérpretes da música brasileira, e suas canções muitas vezes incorporavam elementos das tradições afro-brasileiras, incluindo o Ijexá.
  • Baden Powell: o virtuoso violonista brasileiro, explorou amplamente as raízes africanas na música brasileira, incluindo ritmos como o Ijexá em suas composições.
  • Vinícius de Moraes: o poeta, diplomata e compositor Vinícius de Moraes colaborou com Baden Powell em várias músicas que incorporam elementos da cultura afro-brasileira, podendo incluir o Ijexá.
  • Milton Nascimento: embora seja mais conhecido por suas contribuições ao Clube da Esquina, Milton Nascimento também explorou uma variedade de influências musicais, incluindo elementos afro-brasileiros em sua obra.
    Esses músicos são apenas alguns exemplos, e a música brasileira é incrivelmente diversa, com muitos artistas explorando e incorporando elementos de várias tradições culturais em suas composições.

Algumas composições da MPB baseadas no rítmo do Ijexá

Clara Nunes “Ijexá” – LINK

Djavan “Sina” – LINK

O Que Foi Feito Devera (De Vera) – Elis Regina e Milton Nascimento (1978)- LINK

Gerônimo “É D’Oxum” – Versão 1Versão 2

Gilberto Gil – “Palco” LINK

Caetano Veloso “Beleza Pura” – LINK

Caetano Veloso “Queixa” LINK

Instrumentos musicais

As três figuras rítmicas que compõem o Ijexá são: agogô ou gan, Lé, Rumpi ou Pi. Para seguir essa linguagem rítmica é necessário disciplina para aprender como se canta, aprender como se responde a cantiga, aprender a hora certa de chegar no terreiro, a hora de tomar seu banho e também aprender que o agogô é o primeiro instrumento.

2 Mestres do Ijexá: Moa do Katendê e Gabi Guedes

.Ao explorar a trajetória musical dos mestres e griôs intrinsecamente ligados a essas tradições, é impossível não reconhecer a contribuição singular de dois grandes mestres que desempenharam papéis cruciais na difusão e preservação do Ijexá: mestre Moa do Katendê e mestre Gabi Guedes. Com suas carreiras marcadas por uma profunda imersão nas sonoridades afro-brasileiras, esses artistas transcenderam fronteiras musicais, incorporando o Ijexá em suas performances e composições de maneira única e inovadora. Suas práticas não apenas celebram as raízes africanas entrelaçadas na rica tapeçaria da música brasileira, mas também servem como testemunho da capacidade da arte de conectar culturas e preservar tradições que, de outra forma, poderiam ser esquecidas.

Mestre Moa do Katendê

Mestre Moa do Katendê, cujo nome de batismo era Romualdo Costa, foi uma figura icônica na cultura afro-brasileira, reconhecido por suas contribuições para a preservação e divulgação das tradições afrodescendentes, em especial no contexto do Candomblé e das manifestações culturais afro-brasileiras. Nascido em Salvador, Bahia, em 1954, Mestre Moa foi mestre de capoeira, percussionista e um dos principais difusores do Ijexá, um ritmo afro-brasileiro originário das tradições religiosas.

Sua trajetória ganhou destaque não apenas pela maestria em sua expressão artística, mas também pelo comprometimento com a promoção da igualdade racial e o respeito à diversidade cultural. Mestre Moa era conhecido por fundir a capoeira e a musicalidade afro-brasileira, usando sua arte como instrumento de resistência e afirmação da identidade negra. Além disso, desempenhou papel significativo como guardião das tradições do Candomblé, sendo um defensor da preservação das raízes culturais africanas no contexto brasileiro.

Infelizmente, em outubro de 2018, Mestre Moa do Katendê foi vítima de um ataque fatal motivado por divergências políticas durante as eleições presidenciais no Brasil. Sua trágica morte ressoou como um chamado à reflexão sobre a importância da tolerância e do diálogo, destacando a necessidade de preservar e celebrar as contribuições culturais afro-brasileiras. O legado de Mestre Moa do Katendê vive não apenas na memória daqueles que compartilharam sua jornada, mas também na influência duradoura que deixou na promoção da diversidade e da riqueza cultural do povo brasileiro.

Mestre Gabi Guedes

Gabi Guedes é considerado um dos mais importantes percussionistas da Bahia e do Brasil. Em seu currículo estão registrados os momentos uma trajetória que o levou à palcos de todos os cantos do mundo. Ao longo de sua tragetória tocou junto à grandes nomes da música brasileira, criou ritmos e trilhas sonoras para grandes companhias de dança, integrou a banda do cantor Jimmi Cliff participando de turnês mundiais, ministrou cursos de percussão na França, publicou o livro “Brésil Afro-Roots”, com transcrições de ritmos do candomblé, dentre tantas outras atividades.

Ainda na infância, iniciou os seus estudos de percussão com Alabês do Terreiro de Gantois, Vadinho, Hélio e outros. No Brasil, Gabi Guedes Já tocou com músicos expressivos como Margareth Menezes, Lazzo, Gerônimo, Raimundo Sodré, Armandinho, Paulo Moura, Hermeto Pascoal.

Atualmente, Gabi Guedes é o principal percussionista da Orkestra Afro-Jazz Rumpilezz e dirige seu trabalho de música instrumental (PRADARRUM), além disso, é percussionista da banda base da Jam no MAM (Museu de Arte Moderna) e ministra aulas e workshops de percussão.

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